O impacto da reforma tributária: holding patrimonial
Felipe Probst Werner[1]
Holding patrimonial é uma sociedade voltada à administração de bens e direitos cujo foco geralmente é a gestão de patrimônio de pessoas físicas ou grupos familiares e que pode trazer vantagens tributárias, sucessórias e de organização patrimonial.[2]
Há notícias[3] de que no Brasil já se tenha aproximadamente 117 mil holdings patrimoniais constituídas, número extremamente alto e possível reflexo positivo da utilização deste formato de personalidade jurídica.
Ainda que muitas possam ser as discussões das holdings patrimoniais em sentido de organização de patrimônio e sucessão, o presente estudo focará tão somente nos aspectos tributários que a envolvem, isto é, na tributação patrimonial de pessoas físicas, da pessoa jurídica voltada ao ramo patrimonial, e, por fim, nos reflexos que advirão a tais sociedades com as alterações da reforma tributária voltada ao consumo regulamentada pela Lei Complementar 214/2025.
Neste contexto, conveniente em primeiro lugar traçar o panorama atual e diferença de tributação incidente sobre a comercialização e alugueis de imóveis por pessoas físicas e por pessoas jurídicas que tenham como objeto social a compra e venda e aluguel imóveis próprios.
Para facilitar a compreensão do leitor, apresenta-se o tributo, base de cálculo e alíquotas na tabela 01 abaixo:
Tributação
Pessoa Física
Pessoa Jurídica
Venda de Imóvel
- IRPF: 15% a 22,5% sobre ganho de capital
- Base de cálculo: diferença entre valor de venda e custo de aquisição (com ajustes permitidos)
- IRPJ: 8% presumido sobre receita × 15% de alíquota efetiva (+ 10% quando passa R$120.000,00 ano)
- CSLL: 12% presumido × 9%
- PIS/COFINS:~3,65% cumulativo
- Efetivo total: ~6,73% sobre receita bruta da venda
Aluguel de Imóvel
- IRPF: tabela progressiva (7,5% a 27,5%)
- Base de cálculo: valor do aluguel mensal, sem deduções
- IRPJ: 32% presumido × 15% alíquota = 4,8%
- CSLL: 32% × 9% = 2,88%
- PIS/COFINS: ~3,65% cumulativo
- Efetivo total: ~11,33% sobre receita bruta de aluguel
Tabela 1: fonte[4]
Facilmente se observa que as alíquotas para pessoa jurídica são bem inferiores àquelas da pessoa física, no entanto, não se pode descuidar do fato de que a base de cálculo a lógica inverte-se, já que para a pessoa física é a diferença entre o valor de compra e aquele da venda, e, para a pessoa jurídica, o montante bruto da operação.
Merece destaque o fato de que na venda de imóvel a pessoa física poderá ter isenção de imposto de renda quando o imóvel é vendido por valor inferior a R$440.000,00 (quatrocentos mil reais); quando se vende um imóvel residencial e outro se adquire no prazo de 180 dias; e a redução do ganho de capital em percentual caso a aquisição do mesmo tenha ocorrido antes de 1988.
De toda forma, muito provável que o número crescente de holdings patrimoniais seja atualmente tão alto porque na “ponta do lápis” a tributação culmina por ser menor quando realizadas as operações imobiliárias por meio de pessoas jurídicas com objeto social específico a estes tipos de negócios jurídicos.
Ocorre que com o advento da reforma tributária voltada ao consumo trazida pela LC 214/2025, a tributação das pessoas jurídicas sofrerá acréscimo, razão pela qual se faz pertinente este estudo para que se verifique se ainda continuará sendo tributariamente mais econômica a realização das operações via pessoa jurídica.
Neste ponto, destaca-se em primeiro lugar que o regramento voltado à tributação da renda para pessoa física permanece (por ora) inalterado. Já para as pessoas jurídicas, o percentual de 3,65% relativo à PIS e COFINS será substituído pelos novos tributos criados denominados IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e CBS (Contribuição Social sobre Bens e Serviços).
Em outras palavras, a pessoa jurídica não mais pagará PIS e COFINS que atualmente juntas somam aproximadamente 3,65% da operação realizada, mas, em contrapartida, passarão a pagar sobre todas as suas operações o IBS e o CBS, na forma disposta no art. 251 de LC214/2025.
Ao mesmo tempo, dispõe a LC214/2025 que IBS e CBS passarão a ser cobrados também de pessoas físicas, seja no caso de venda (quando forem alienados mais de 03 imóveis no ano calendário anterior ou um imóvel construído pelo próprio contribuinte nos últimos cinco anos da data da alienação; seja no caso de locação (quando a receita das operações exceder R$240.000,00 e houver mais de 03 imóveis locados por tal contribuinte).
Desta forma, respeitadas as exceções acima mencionadas, verifica-se que a regra geral é que no volume, tanto pessoa física como jurídica passarão a ser tributados pelo IBS como CBS, situação que fará com que a diferença de tributação entre pessoa física e jurídica seja ainda maior.
Não há como se precisar atualmente quais serão as alíquotas de IBS e CBS, contudo, dispõe a LC214/2025 que além de redutores especificados que dependem da data e valor da operação anterior já tributada pelo IBS e CBS, as alíquotas para compra e venda serão diminuídas em 50% e para as locações em 70%[5], ambas daquilo que futuramente fixado pela União, Estados, Município de Distrito Federal[6].
Cumpre esclarecer que a reforma tributária inicia a ser aplicada em 2026 como teste, ou seja, com alíquotas pequenas que serão substituídas de outros tributos pagos pelos contribuintes, contudo, de 2027 até 2033 as alterações impactarão progressivamente este tipo de operação.
Para concluir, se destaca que a reforma tributária impactará a holding patrimonial e possivelmente fará com que a tributação total seja incrementada. O exato montante, contudo, apenas se descobrirá quando os entes competentes fixarem as alíquotas definitivas.
De toda sorte, fato é que muito possivelmente a tributação para a pessoa física sofrerá acréscimo maior – nos casos em que ela tiver mais de três bens, por exemplo -e, por isso, ainda que tudo mais custos, será menos onerosa transmutação de todas as operações para pessoa jurídica.
Itajaí/SC, 23 de maio de 2025.
[1] Pós-doutor em análise econômica do direito. Doutor em direito civil pela PUC/SP. Professor. Coordenador de curso de pós-graduação em direito imobiliário, notarial e registral. Parecista.
[2] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. Volume 2
[3] Vide https://www.portaldoagronegocio.com.br/politica-rural/assuntos-juridicos/artigos/holding-se-torna-cada-vez-mais-uma-saida-para-protecao-patrimonial?utm_source=chatgpt.com
[4] Lei 7.713/1988; IN RFB 84/2001; Lei 9.249/95; Lei 9.430/96; Lei 10/637/2002; e Lei 10.833/2003.
[5] Vide art. 261 e seu parágrafo único da LC214/2025.
[6] Vide arts. 14 a 17 da LC214/2025.