Comentários a cerca das recentes modificações promovidas no Código Florestal Brasileiro
Por Gabriela Campos dos Reis
13/05/2022
Ao final do ano de 2021, mais precisamente no dia 30 de dezembro, foi publicada a Lei n. 14.285, que modificou, entre outras legislações, o Código Florestal Brasileiro (Lei n. 12.651/2012).A partir da edição da referida norma, o conceito jurídico de “área urbana consolidada” deixou de ser indeterminado e passou a constar do inciso XXVI do art. 3º da Lei n. 12.651/2012. Veja-se:
''Art. 3º [...] XXVI – área urbana consolidada: aquela que atende os seguintes critérios:a) estar incluída no perímetro urbano ou em zona urbana pelo plano diretor ou por lei municipal específica; b) dispor de sistema viário implantado; c) estar organizada em quadras e lotes predominantemente edificados; d) apresentar uso predominantemente urbano, caracterizado pela existência de edificações residenciais, comerciais, industriais, institucionais, mistas ou direcionadas à prestação de serviços; e) dispor de, no mínimo, 2 (dois) dos seguintes equipamentos de infraestrutura urbana implantados: 1. drenagem de águas pluviais; 2. esgotamento sanitário; 3. abastecimento de água potável; 4. distribuição de energia elétrica e iluminação pública; e5. limpeza urbana, coleta e manejo de resíduos sólidos; [...].''
Uma área urbana que preencha os requisitos legais para ser considerada consolidada pode ser, agora, objeto de regulamentação Municipal ou Distrital quanto às faixas marginais dos cursos d’água inseridos em seu território.Tal autorização consta do incluso § 10 do art. 4º do Código Florestal Brasileiro, que dispõe:
Art. 4º [...] § 10. Em áreas urbanas consolidadas, ouvidos os conselhos estaduais, municipais ou distrital de meio ambiente, lei municipal ou distrital poderá definir faixas marginais distintas daquelas estabelecidas no inciso I do caput deste artigo, com regras que estabeleçam:I – a não ocupação de áreas com risco de desastres;II – a observância das diretrizes do plano de recursos hídricos, do plano de bacia, do plano de drenagem ou do plano de saneamento básico, se houver; eIII – a previsão de que as atividades ou os empreendimentos a serem instalados nas áreas de preservação permanente urbanas devem observar os casos de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental fixados nesta Lei.
A edição da Lei n. 14.285/2021 e as consequentes alterações por ela promovidas causou polêmica e divide os entendimentos dos estudiosos do Direito. Há quem aplauda sua edição, assim como quem a repudie.Dúvidas não há de que se trata de uma resposta do Congresso Nacional à decisão proferida pelo Tribunal da Cidadania no julgamento do Tema 1010.No ano de 2021, em meados de abril, o Superior Tribunal de Justiça decidiu aplicar retroativamente as disposições do Código Florestal Brasileiro em face das construções existentes às margens dos cursos d`água, tanto nas áreas urbanas quanto nas áreas rurais.Na prática, todas as construções, até mesmo as já existentes, estariam sujeitas aos limites previstos na referida legislação, que variam entre 30 a 500 metros de área não edificável.
Apesar de a decisão do Tribunal da Cidadania ainda não ser definitiva, houve grande repercussão na sociedade, que começou a antever seus efeitos práticos. Foi nesse cenário que o Congresso Nacional modificou algumas disposições do Código Florestal Brasileiro (Lei n. 12.651/2012) através da edição da Lei n. 14.285/2021.
Aqueles que entendem as modificações pertinentes, o fazem por acreditar que os Entes Federados locais (Municípios ou Distrito Federal) possuem melhores condições para definir aquilo que se adequa à realidade vigente em seu território, pois em um País com dimensões continentais e diversos tipos de geografia e clima, o estabelecimento de uma regra geral não atende, em grande parte dos casos, aos critérios de justiça.
Por outro lado, há fortes posicionamentos no sentido que a Lei n. 14.285/2021 é inconstitucional, pois suas disposições teriam violado a competência privativa da União de definir normas gerais mais protetivas, que são de observância compulsória por todos os entes políticos em matéria ambiental (art. 24, VI e parágrafo único, da CF).
Vale dizer, no exercício da competência concorrente/residual, os Municípios e o Distrito Federal não poderiam flexibilizar os níveis de proteção ambiental, apenas reforçá-los.Sem aprofundar o estudo e visando, tão somente, levantar pontos para incitar o debate, encerra-se o presente parecer.