O Benefício de Prestação Continuada está previsto na Lei Orgânica de Assistência Social, Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993. É um benefício assistencial, no valor de um salário mínimo mensal, destinado à pessoa com deficiência e ao idoso, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, que comprovem não possuir meios financeiros de prover a sua própria subsistência.
O critério socioeconômico, previsto no art. 20 da citada Lei, prevê que apenas terá direito ao benefício, a pessoa com renda familiar mensal per capita igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, atualmente R$275,00 (duzentos e setenta e cinco reais).
Ocorre que, por muitas vezes a renda familiar supera o limite financeiro previsto na lei. No entanto, as famílias têm diversos gastos, como aluguel, medicamentos, alimentação e outros, e no final das contas a renda total não é capaz de suprir nem as necessidades mais básicas da família.
Este critério fixo e engessado de aferir a situação financeira da família foi levado à análise do Supremo Tribunal Federal no RE 567985/MT, que decidiu por declarar parcialmente inconstitucional o critério previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, levando em consideração que se deve avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes.
Por esse motivo, atualmente este requisito fixo de renda familiar, vem sendo flexibilizado pelo Poder Judiciário.
No entanto, no processo administrativo previdenciário, o INSS ainda continuava utilizando como critério socioeconômico estritamente o que previa a Lei.
Foi então, que através de uma Ação Civil Pública, 5044874-22.2013.404.7100-RS[1], passou-se a deduzir do cálculo da renda familiar as despesas que decorram diretamente da deficiência ou idade avançada, com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis e consultas na área da saúde, comprovadamente requeridos e negados pelo Estado.
Com as notícias do advento da Lei 14.176/2021, muitas famílias que buscam a concessão do BPC, interpretaram o parágrafo 11-A[2], do art. 20, como se houvesse uma ampliação do critério de renda per capita de ¼ para ½ salário mínimo, o que ampliaria número de famílias beneficiadas.
Ocorre que, esta alteração deve ser analisada em conjunto com o que prevê o art. 20-B, também incluído pela Lei 14.176/2021:
Art. 20-B. Na avaliação de outros elementos probatórios da condição de miserabilidade e da situação de vulnerabilidade de que trata o § 11 do art. 20 desta Lei, serão considerados os seguintes aspectos para ampliação do critério de aferição da renda familiar mensal per capita de que trata o § 11-A do referido artigo:
I - o grau da deficiência;
II - a dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária; e
III - o comprometimento do orçamento do núcleo familiar de que trata o § 3º do art. 20 desta Lei exclusivamente com gastos médicos, com tratamentos de saúde, com fraldas, com alimentos especiais e com medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados gratuitamente pelo SUS, ou com serviços não prestados pelo Suas, desde que comprovadamente necessários à preservação da saúde e da vida.
§ 1º A ampliação de que trata o caput deste artigo ocorrerá na forma de escalas graduais, definidas em regulamento.
§ 2º Aplicam-se à pessoa com deficiência os elementos constantes dos incisos I e III do caput deste artigo, e à pessoa idosa os constantes dos incisos II e III do caput deste artigo.
§ 3º O grau da deficiência de que trata o inciso I do caput deste artigo será aferido por meio de instrumento de avaliação biopsicossocial, observados os termos dos §§ 1º e 2º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), e do § 6º do art. 20 e do art. 40-B desta Lei.
§ 4º O valor referente ao comprometimento do orçamento do núcleo familiar com gastos de que trata o inciso III do caput deste artigo será definido em ato conjunto do Ministério da Cidadania, da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia e do INSS, a partir de valores médios dos gastos realizados pelas famílias exclusivamente com essas finalidades, facultada ao interessado a possibilidade de comprovação, conforme critérios definidos em regulamento, de que os gastos efetivos ultrapassam os valores médios.
Conclui-se, portanto, que na prática, não houve muita mudança. Pois o que a nova Lei prevê é que a renda per capita poderá, sim, ser ampliada para ½ salário mínimo, no entanto, desde que comprovado que os gastos excessivos são exclusivamente com alimentação especial, medicamentos, fraldas e tratamentos de saúde do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados gratuitamente pelo Estado, seguindo o que já vinha sendo aplicado por força da Ação Civil Pública, 5044874-22.2013.404.7100-RS.
BRASIL, Lei 14.176 de 22 de junho de 2021. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/Lei/L14176.htm>. Acesso em: 01 ago. 2021.
STF. RECURSO EXTRAORDINÁRIO: 567985 MT, Relator: Ministro Marco Aurélio, Data de Julgamento: 18/04/2013, Data de Publicação: 03/10/2013. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur243572/false>. Acesso em: 01 ago. 2021.
TRF-4. APELAÇÃO REEXAME NECESSÁRIO: 50448742220134047100/RS, Relator: Vânia Hack de Almeida, Data de Julgamento: 27/01/2016, Sexta Turma, Data de Publicação: 04/02/2016. Disponível em: <https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?orgao=1&documento=7940953>. Acesso em: 01 ago. 2021.
[1] AÇÃO CIVIL PÚBLICA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IDOSO E DEFICIENTE FÍSICO. REQUISITO ECONÔMICO. DEDUÇÕES. MÍNIMO EXISTENCIAL. RESERVA DO POSSÍVEL. ABRANGÊNCIA NACIONAL DOS EFEITOS DA DECISÃO. [...] 9. Recurso parcialmente acolhido para compelir o réu a deduzir do cálculo da renda familiar, para fins de verificação do preenchimento do requisito econômico ao benefício de prestação continuada do art. 20 da Lei nº 8.742/93, apenas as despesas que decorram diretamente da deficiência, incapacidade ou idade avançada, com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis e consultas na área da saúde, comprovadamente requeridos e negados pelo Estado. 10. Considerando a mudança de entendimento do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1243887/PR, Corte Especial, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe de 12-12-2011) e tendo em conta o teor da presente demanda, que visa garantir os interesses assistenciais, impõe-se determinar a extensão dos efeitos da presente ação civil pública a todo território nacional.(TRF-4 - APELREEX: 50448742220134047100 RS 5044874-22.2013.404.7100, Relator: VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 27/01/2016, SEXTA TURMA, Data de Publicação: D.E. 04/02/2016)
[2] Art. 20 § 11-A. O regulamento de que trata o § 11 deste artigo poderá ampliar o limite de renda mensal familiar per capita previsto no § 3º deste artigo para até 1/2 (meio) salário-mínimo, observado o disposto no art. 20-B desta Lei.