A chamada Reforma Trabalhista, realizada através do advento da Lei 13.467 de 2017, entre outras mudanças significativas, trouxe a possibilidade de alteração de direitos e deveres trabalhistas através de convenção e acordos coletivos de trabalho, sendo que o que for negociado terá prevalência sobre a Consolidação das Leis Trabalhistas.
Com isso, empregados e empregadores, através de seus respectivos sindicatos, têm maior flexibilidade para negociar as relações trabalhistas da melhor forma para cada categoria ou região, levando em conta as peculiaridades e necessidades de cada local, gerando empregos e aumentando a competitividade. O art. 611-A da CLT prevê expressamente esta possibilidade e descreve um rol exemplificativo de assuntos que podem ser objeto de acordo:
Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre:
I - pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites constitucionais;
II - banco de horas anual;
III - intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos para jornadas superiores a seis horas;
IV - adesão ao Programa Seguro-Emprego (PSE), de que trata a Lei no 13.189, de 19 de novembro de 2015;
V - plano de cargos, salários e funções compatíveis com a condição pessoal do empregado, bem como identificação dos cargos que se enquadram como funções de confiança;
VI - regulamento empresarial;
VII - representante dos trabalhadores no local de trabalho;
VIII - teletrabalho, regime de sobreaviso, e trabalho intermitente;
IX - remuneração por produtividade, incluídas as gorjetas percebidas pelo empregado, e remuneração por desempenho individual;
X - modalidade de registro de jornada de trabalho;
XI - troca do dia de feriado;
XII - enquadramento do grau de insalubridade;
XIII - prorrogação de jornada em ambientes insalubres, sem licença prévia das autoridades competentes do Ministério do Trabalho;
XIV - prêmios de incentivo em bens ou serviços, eventualmente concedidos em programas de incentivo;
XV - participação nos lucros ou resultados da empresa.
Já no art. 611-B, a CLT traz um rol taxativo de direitos que não podem ser reduzidos ou suprimidos através de acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho:
Art. 611-B. Constituem objeto ilícito de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho, exclusivamente, a supressão ou a redução dos seguintes direitos:
I - normas de identificação profissional, inclusive as anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II - seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário;
III - valor dos depósitos mensais e da indenização rescisória do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS);
IV - salário mínimo;
V - valor nominal do décimo terceiro salário;
VI - remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;
VII - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa;
VIII - salário-família;
IX - repouso semanal remunerado;
X - remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em 50% (cinquenta por cento) à do normal;
XI - número de dias de férias devidas ao empregado;
XII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;
XIII - licença-maternidade com a duração mínima de cento e vinte dias;
XIV - licença-paternidade nos termos fixados em lei;
XV - proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei;
XVI - aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei;
XVII - normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho;
XVIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas;
XIX - aposentadoria;
XX - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador;
XXI - ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;
XXII - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador com deficiência;
XXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;
XXIV - medidas de proteção legal de crianças e adolescentes;
XXV - igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso;
XXVI - liberdade de associação profissional ou sindical do trabalhador, inclusive o direito de não sofrer, sem sua expressa e prévia anuência, qualquer cobrança ou desconto salarial estabelecidos em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho;
XXVII - direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender;
XXVIII - definição legal sobre os serviços ou atividades essenciais e disposições legais sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade em caso de greve;
XXIX - tributos e outros créditos de terceiros;
XXX - as disposições previstas nos arts. 373-A, 390, 392, 392-A, 394, 394-A, 395, 396 e 400 desta Consolidação.
Importante ressaltar que os direitos previstos na Constituição Federal também não podem ser objeto de negociação, porém, mesmo com algumas restrições, empregados e empregadores têm muitos temas passíveis de serem negociados. O acordo deve ser obrigatoriamente intermediado pelos sindicatos representantes da categoria profissional e patronal, que deverão seguir as regras previstas no art. 612 e seguintes da CLT.
O tema ainda é controvertido perante a Justiça Especializada. Recentemente, em 28/06/2019, o Ministro do STF Gilmar Mendes determinou a suspensão de todas as ações trabalhistas que analisam a contestação de cláusulas previstas em acordos e convenções coletivas que restringem ou limitam direitos trabalhistas não previstos na Constituição.
O caso chegou ao STF após um minerador ingressar com ação trabalhista pleiteando o pagamento de horas extras referente ao período que ele gastava para se deslocar ao trabalho com transporte fornecido pela empresa. Em primeiro grau o trabalhador perdeu a causa. A sentença foi reformada pelo Tribunal Regional do Trabalho e ratificada pelo Tribunal Superior do Trabalho. Em sua defesa a empresa sustenta exatamente a prevalência do acordo coletivo sobre a legislação trabalhista, pleiteando pela legalidade e aplicabilidade do que foi acordado.
O pedido de suspensão das demais ações envolvendo o mesmo tema partiu da Confederação Nacional da Indústria (CNI), que ingressou na ação na condição de amicus curiae, por ter interesse no tema. Assim, em breve o STF deve firmar entendimento definitivo acerca do assunto, para que seja aplicado a todos os processos em tramite, garantindo segurança jurídica aos jurisdicionados. Até lá, as negociações coletivas continuam valendo, ficando suspensas apenas as ações judiciais que discutam a validade das cláusulas pactuadas.