DISCUSSÃO SOBRE A POSSIBILIDADE DE INCLUSÃO DE EMPRESA INTEGRANTE DE GRUPO ECONÔMICO NO POLO PASSIVO DA EXECUÇÃO TRABALHISTA
Há mais de duas décadas a Justiça do Trabalho discute a possibilidade de inclusão no polo passivo da lide, na fase de execução trabalhista, de empresa integrante de grupo econômico que não tenha participado do processo de conhecimento.
Atualmente, pende de julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) o Recurso Extraordinário n.º 1387795, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.232), que objetiva dirimir a controvérsia e que através de decisão monocrática determinou a suspensão nacional do processamento de todas as execuções trabalhistas que versem sobre a questão até o julgamento definitivo do recurso.
Em suma, a discussão gira em torno de possível ofensa ao direito ao contraditório e à ampla defesa da empresa integrante de grupo econômico, que tem contra si direcionada execução trabalhista sem ter participado da fase de formação do título executivo.
O grupo econômico no Direito do Trabalho é regulado pelos §§ 2º e 3º do artigo 2º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que preveem os pressupostos de constituição e, ainda, que as empresas integrantes do mesmo grupo possuem responsabilidade solidária pelas obrigações decorrentes do contrato de trabalho, ainda que guardem personalidade jurídica própria e diversa daquela com quem o empregado teve sua carteira de trabalho anotada.
Para fins de aplicação da legislação trabalhista, as empresas integrantes de um grupo econômico são legalmente entendidas como uma só[1], é a chamada teoria do empregador único. Tanto é assim, que a Súmula 129 do TST prevê que não caracteriza a coexistência de mais de um contrato de trabalho, a prestação de serviços que ocorre durante a mesma jornada para mais de uma empresa do mesmo grupo[2].
A teoria do empregador único conversa com o conceito de “empregador” que se extrai da CLT no artigo 2º. Observa-se que o legislador celetista considera como empregador a empresa, consistente na atividade econômica produtiva organizada, e não a pessoa jurídica ou física que admite, assalaria e toma os serviços do empregado[3].
Sobre isso, Arnaldo Süssekind, um dos membros da Comissão Elaboradora da Consolidação das Leis do Trabalho, esclareceu que a expressão “empresa” foi adotada com a intenção de refletir a despersonalização do empregador[4], ou seja, o legislador trabalhista vinculou o empregado à atividade econômica, independente da pessoa física ou jurídica que a explora, com o intuito de proteger o trabalhador de eventual mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa[5].
A partir disso, é admissível concluir que o contraditório no que tange à existência da dívida pode ser exercido na fase de cognição por uma das empresas pertencentes ao grupo, sendo geralmente aquela que contratou diretamente o trabalhador, já que entendidas como uma só[6].
Com o direcionamento da execução trabalhista em face da empresa integrante do grupo econômico, surgem os meios de defesa cabíveis na fase executiva, que são, in tese, embargos à execução (art. 884 da CLT) ou embargos de terceiro (674 do CPC), decisão dos quais cabe interposição de agravo de petição (art. 897, a, da CLT).
No entanto, denota-se dos julgados do TST[7], que há controvérsia acerca da medida de defesa cabível, se embargos à execução ou embargos de terceiro, o que traz incerteza sobre qual o meio adequado para o exercício do contraditório da empresa incluída na fase de execução e representa insegurança jurídica no Processo do Trabalho.
Diante disso, considerando que o Direito do Trabalho possui normativa própria sobre o grupo econômico, em que as empresas integrantes são entendidas como uma só e possuem responsabilidade solidária sobre as obrigações decorrentes da relação de trabalho, é razoável compreender que o principal estímulo para a discussão sobre a violação à ampla defesa e ao contraditório está mais atrelado à inexistência de procedimento na fase de execução do que na necessidade de participação da fase de conhecimento, o que será, este último, decidido pelo STF no Recurso Extraordinário n.º 1387795.
Recentemente, no julgamento do REsp 1.864.620, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o redirecionamento de penhora para outras empresas do mesmo grupo econômico da executada depende de prévia instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica. O fundamento é de que a responsabilidade subsidiária prevista no artigo 28, §2º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), não exclui a necessidade de garantir o contraditório e a ampla defesa.
A instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, apesar de previsto no artigo 855-A da CLT, não é comumente aplicado nas demandas trabalhistas para inclusão de empresa integrante de grupo econômico, contudo, pode ser essa uma possível “solução” para a controvérsia, utilizando o regramento por analogia enquanto não sobrevier regramento específico[8].
Ariany Cristini dos Santos
OAB/SC 52.394
[1] MARTINEZ, Luciano. Curso de Direito do Trabalho. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2021. p. 311.
[2] BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula nº 129. A prestação de serviços a mais de uma empresa do mesmo grupo econômico, durante a mesma jornada de trabalho, não caracteriza a coexistência de mais de um contrato de trabalho, salvo ajuste em contrário. Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003.
[3] CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho: de acordo com a reforma trabalhista. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019. p. 415.
[4] SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes. O cinquentenário da CLT. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/7419934/mod_resource/content/1/Cinq%C3%BCenten%C3%A1rio%20da%20CLT.pdf. Acesso em: 22/09/2023.
[5] CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho: de acordo com a reforma trabalhista. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019. p. 415.
[6] BERNARDES, Felipe. Grupo econômico no Processo do Trabalho: O incidente da desconsideração da personalidade jurídica é pertinente para o reconhecimento de grupo econômico? Disponível em: https://trabalhoemdebate.com.br/artigo/detalhe/grupo-economico-no-processo-do-trabalho. Acesso em: 22/09/2023.
[7] Recurso de Revista n. 57-74.2017.5.02.0023 e Agravo n. 1000485-53.2021.5.02.0361.
[8] BERNARDES, Felipe. Grupo econômico no Processo do Trabalho: O incidente da desconsideração da personalidade jurídica é pertinente para o reconhecimento de grupo econômico? Disponível em: https://trabalhoemdebate.com.br/artigo/detalhe/grupo-economico-no-processo-do-trabalho. Acesso em: 22/09/2023.