AS DESPESAS DECORRENTES DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EM REGIME DE TELETRABALHO PODEM SER ARCADAS PELO EMPREGADO?
Com o advento da Lei n.º 13.467/2017, chamada Lei da Reforma Trabalhista, a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT passou a prever em seu artigo 75-D o seguinte:
Art. 75-D. As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito.
Observa-se que o dispositivo legal supracitado dá possibilidade de as partes pactuarem livremente em contrato escrito se as despesas decorrentes da prestação de serviços em regime de teletrabalho serão arcadas pelo empregado ou pelo empregador.
Ocorre que há controvérsia na aplicação do artigo 75-D da CLT, especialmente se confrontado com o princípio da alteridade, consubstanciado no artigo 2º da CLT, que prevê que os riscos da atividade econômica devem ser suportados pelo empregador, no que se inclui a responsabilidade por despesas com ferramentas e estrutura para prestação dos serviços.
A discussão em torno do tema é objeto de debate na jurisprudência trabalhista, dentre as quais se destaca a recente decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região – TRT18:
TRABALHO REMOTO. REEMBOLSO PELA UTILIZAÇÃO DE EQUIPAMENTOS PRÓPRIOS. A previsão contida no art. 75-D da CLT e no art. 4º, § 3º da Medida Provisória nº 927/2020 não altera a responsabilidade do empregador por todas as despesas decorrentes da prestação de serviços em regime de teletrabalho/trabalho remoto e, muito menos, transfere os custos da produção ao empregado, à luz do que dispõe o art. 2º da CLT. Portanto, é procedente o pedido de reembolso do empregado que utilizou recursos próprios para exercer as atividades laborais por meio de trabalho remoto. (TRT18, RORSum - 0010274- 62.2021.5.18.0001, Rel. PLATON TEIXEIRA DE AZEVEDO FILHO, 2ª TURMA, 24/06/2022) (TRT-18 - RORSUM: 00102746220215180001 GO 0010274-62.2021.5.18.0001, Relator: PLATON TEIXEIRA DE AZEVEDO FILHO, Data de Julgamento: 24/06/2022, 2ª TURMA)
Observa-se que o entendimento do TRT18, com amparo no artigo 2º da CLT, é no sentido de que é de responsabilidade do empregador arcar com as despesas decorrentes da prestação de serviços em regime de teletrabalho, apesar da permissão exposta no artigo 75-D da CLT.
Diversamente, no entanto, assevera a doutrinadora Vólia Bomfim Cassar, que indica que por conta do previsto no dispositivo legal comentado poderá ser repassado ao empregado os riscos com o material do trabalho[1].
No mesmo sentido decide o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região – TRT2:
DESPESAS COM TELETRABALHO. Considera-se teletrabalho a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências da empresa ré, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação. Em regra, nos termos do art. 2º da CLT, os riscos da atividade econômica devem ser suportados pelo empregador, uma vez que é de responsabilidade exclusiva da empresa os prejuízos do empreendimento, consoante preceitua o princípio da alteridade. Todavia, há permissivo no art. 75-D da CLT para que as partes pactuem livremente, em contrato individual escrito, a responsabilidade pelas despesas com aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto. (TRT-2 10005555620215020204 SP, Relator: MARIA DE FATIMA DA SILVA, 17ª Turma - Cadeira 5, Data de Publicação: 10/12/2021) (Grifou-se)
Denota-se da decisão acima, que o TRT2 manteve a sentença de primeiro grau, negando o pedido de ressarcimento do empregado com despesas decorrentes do trabalho remoto, vez que as partes haviam pactuado que seria de responsabilidade da empregada o custeio das ferramentas e infraestrutura necessários à prestação de serviços no regime de teletrabalho, conforme permitido pelo artigo 75-D da CLT.
Apesar de breves os destaques, é possível perceber que não é unânime o entendimento sobre o tema, o que causa insegurança jurídica, notadamente quando ocorre alteração do regime de trabalho presencial para o de teletrabalho.
Apesar disso, utilizando-se de interpretação gramatical, depreende-se da leitura do artigo 75-D da CLT, que a intenção do legislador é tornar possível, por meio de contrato escrito, que as partes pactuem livremente quem será responsável por arcar com as despesas decorrentes do trabalho remoto, permitindo, portanto, a responsabilização do empregado.
Itajaí/SC, 18 de outubro de 2022.
ARIANY CRISTINI DOS SANTOS
OAB/SC 52.394
[1] CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho: de acordo com a reforma trabalhista. 16 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019. p. 670.